Mesmo desprovidos de instrumentos ca-pazes de antever com precisão absolu-ta o comportamento das variáveis fu-turas que influenciarão o desempenho das matérias-primas agrícolas, a firme demanda atual por alimentos (principalmente da China) e as hipotéticas adversidades climáticas (no Brasil, Argentina e Estados Unidos) podem ser capazes de manter os preços nesses patama-res elevados por um bom tempo.
Milho e soja, res-pectivamente, já subiram em dólares no ano cor-rente, 25% e 14% e, em doze meses, 43% e 54% (fevereiro/21 em comparação a fevereiro/20). Inclusive, alguns analistas apostam até em um novo “super ciclo” das commodities (notadamente petróleo e minério de ferro), sustentado pelo estímulo fiscal e expansão monetária, depreciação do dólar e escassez de melhores alternativas de inves-timento frente à liquidez corrente, muito embora a abrangência da pandemia e a intensidade dos seus efeitos, sabidamente continuarão dosando o nível e a sincronia global de recuperação econômica. Um “super ciclo” é conceituado como o even-to que se repete na linha do tempo e pode ser ob-servado quando o desvio do preço de uma mer-cadoria varia no mínimo 20% sobre sua linha de tendência (altas e baixas), ao longo de décadas, do seu início até o fim.
À título de ilustração, os resultados de estudos do National Bureau of Economic Research (Cambridge/USA) demons-traram que os preços deflacionados das commo-dities agrícolas em 2010 eram mais baixos do que em 1950, e que a partir de 1970, foi possível perceber uma onda descendente de preços que completou um ciclo de 40 anos em 2010 (David S. Jacks, From Boom to Bust: A typology of real commodity prices in the long run, March 2013).
A escalada vislumbrada seria mais um su-per ciclo tendendo à valorização das cotações ou, ao contrário, apenas recuperação compen-satória pós-baque de 2020?Independentemente da motivação, o incremen-to dos preços do minério de ferro, carnes, milho, so-ja, etc. favorece os países predominantemente ex-portadores dessas commodities, a exemplo do Bra-sil, bastante beneficiado durante a fartura verifica-da entre os anos de 2004 e 2008. Atualmente, con-tudo, a resiliente desvalorização do Real vai impulsionando com força os preços domésticos e justi-ficando o iminente incremento na taxa de juros.
Apesar da escancarada urgência, o Congres-so Nacional continua adiando as reformas (ad-ministrativa, política e principalmente a tribu-tária), enquanto o Executivo teima elevar a ta-xação de diversos setores (petroquímico e finan-ceiro, por exemplo) a fim de “compensar” outros (GLP e diesel), turbinando a percepção que as medidas populistas se sobrepõem àquela de-sejada agenda liberal. O crescente descontro-le fiscal continua impulsionando a taxa de ris-co/CDS, aumentando a desconfiança, limitan-do a aposta dos investidores estrangeiros, e en-tão retroalimentando o dólar no ambiente do-méstico, cujos consumidores já vem sofrendo bastante com o custo da alimentação inflacio-nado pelos preços no atacado que também so-frem os efeitos das cotações das commodities.
Esses eventos repetitivos e sucessivos, combi-nados à falta de imunizantes e ao recrudescimen-to da pandemia da Covid-19 em praticamente to-dos os municípios, mitiga a convicção otimista da recuperação econômica Brasileira no curto prazo.Parece que realmente “Essa epidemia não vai acabar em lugar nenhum, se não acabar em todos os lugares” (Harvey Fineberg, Esco-la de Saúde Pública/Harvard)
fonte: Sindrações, escrita por Ariovaldo Zani